Um partido político que não se renova, definha, e só não morrerá se as barreiras à entrada forem de tal ordem que dificilmente possam entrar outros competidores.

Já quase tudo se escreveu sobre 2018, entre as previsões, as aspirações e os receios. Em bom rigor cada um de nós será essencialmente alheio ao que, de bom ou mau, irá acontecer neste novo ano. Sendo verdade, esta afirmação está sujeita à falácia da composição.

O novo ano será aquilo que todos nós fizermos dele. Nesse sentido deixo ao ano novo três palavras que se ramificam noutras.

Renovação. A vida só subsiste devido a uma renovação de células, em que umas morrem e outras se reproduzem. A renovação é, não apenas o fundamento da continuação da vida, como da dinâmica das organizações, dos países, das civilizações.

É algo tão evidente que por vezes nos esquecemos desta elementar palavra. Uma empresa que não inova, se estiver num mercado competitivo, decresce e eventualmente morre, pois aquelas com quem compete ganhar-lhe-ão quota de mercado. Um partido político que não se renova, definha, e só não morrerá se as barreiras à entrada forem de tal ordem que dificilmente possam entrar outros competidores.

Na sociedade em que vivemos as pessoas gostam de novas experiências, produtos, ideias e tenderão a premiar os que inovam e não os que apresentam sempre o mesmo “produto”. Uma importante variante ao principio geral que a renovação é essencial à sobrevivência é a existência de lealdade, de rotinas e do gosto pelo já conhecido (na comida, na música, na arte visual).

Podemos ter partidos que sobrevivem porque as pessoas são leais ao partido. A lealdade, porém, não substitui a renovação, adia-a, eventualmente uma geração. Empresas, partidos ou qualquer outra organização são feitos de pessoas e a existência de renovação organizacional pressupõe que uma ou várias pessoas, com capacidade de influencia, tenham um efetivo desejo de renovação.

Em última instância a renovação remete para uma mudança individual, do eu, que se pode tornar contagiosa. Renovação, sugere assim inovação, renascimento, transformação.

Respeito. é a palavra relacional por excelência entre eu e o outro (se a colocarmos num plano igualitário fora do “respeitinho”). É necessário para satisfazer muitos dos princípios enunciados nas declarações universais dos direitos humanos e, em particular, da criança.

Respeito, sugere preservar a esfera de autonomia do outro e o direito de ser aquilo que é. Respeito tem a ver com o reconhecimento de igualdade de direitos e a não discriminação seja com que fundamento for. É também uma palavra instrumental. Respeito porque quero ser respeitado e valorizo o princípio da simetria. Nada tem a ver com tolerância. Não tolero que uma mulher goste de um homem.

Respeito a heterossexualidade, da mesma maneira que a homossexualidade, pois cada uma tem a ver com a identidade da(o) outra(o) e a sua autonomia relacional. Respeito a liberdade de cada um desde que ela não interfira, de forma não razoável, com a liberdade dos outros ou de mim próprio. Que haja quem se sinta bem com tatuagens e com piercings, quem goste de ananás e quem prefira laranjas.

O respeito percebe-se por expressões da sua negação. Todas as formas de assédio (sexual, laboral, e outras) são a materialização da ausência de respeito. Se 2017 foi um ano de empoderamento da mulher nalguns países desenvolvidos, em parte devido aos casos de assédio que vieram a lume, era bom que 2018 o fosse nos países em desenvolvimento. Sabemos, há décadas, que o microcrédito funciona melhor quando gerido por mulheres.

Soubémos agora que em 2018 as mulheres poderão conduzir um carro na Arábia Saudita. Há um longo caminho a percorrer, de enorme potencial, na senda do respeito. Podemos então encadear palavras: respeito, igualdade, liberdade, não discriminação, desenvolvimento.

Pertença. A ideia que vamos pertencendo a algo mais vasto, a múltiplas comunidades e territórios diferentes. A da família, a de um grupo de amigos, a dos que partilham connosco uma maneira de estar na vida ou uma visão desta.

A dos que habitam na nossa aldeia (porque quase todos temos uma “aldeia”) ou num território mais vasto a que chamamos país. A dos que falam a língua portuguesa, a dos animais (humanos ou não) a dos seres vivos.

Se pertencemos a uma comunidade é porque partilhamos algo, e o que partilhamos é fonte da nossa identidade e tende a desenvolver sentimentos de altruísmo, reciprocidade e simpatia, em relação aos outros e que ultrapassam a satisfação das necessidades práticas imediatas do nosso eu. A pertença não é apenas do hoje e do agora, sincrónica, mas na escala do tempo, diacrónica.

Pertencemos a um momento único do tempo, somos um pequeníssimo elo numa longa cadeia de gerações que nos precedeu, e que nos vai suceder. Somos residentes temporários do planeta Terra e por isso dela temos o usufruto hoje, mas que em nada deverá diminuir o potencial de benefícios daqueles que virão depois de nós.

A palavra pertença, pode assim remeter para: empatia, simpatia, cooperação, solidariedade, sustentabilidade.

Os votos que deixo para 2018 são os de renovação individual, respeito pela outra e pelo outro e reforço do sentimento de pertença. Votos para o ano que vem, e para todos os que se lhe sucederem.

 

Publicado originalmente no Observador a 02.01.2018